quinta-feira, 30 de abril de 2009

Não é curioso
que a bolsinha com produtos
de pele, beleza e banho
tenha, justamente,
um nome francês?
Necessaire...
A fama é justa,
nada estranho.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

O enólogo

- Cheira, cheira, cheira!!
- Quê?...ah, vai se fuder, caralho!
Disse se levantando.
- Não gostou? Porra, foi bom pra cacete!
- Como assim foi bom pra cacete?
- Cara, o pior é que eu até gosto.
- Do cheiro?
- É.
- Cê gosta de cheiro de peido?
- Porra, tenho vergonha de falar. Nunca falei isso pra ninguém...
- Cê tá louco, véio?
- Porra, cê é meu camarada, acho que eu posso te falar. Não é uma coisa muito agradável de se dizer, eu sei.
- Peraí, vamos começar de novo. Cê tá falando sério?
- Tô, cara.
- ...
- Não tem gente que gosta da Ana Maria Braga? Não tem gente que gosta de jiló, quiabo, essas porras todas?
- Tem. E daí?
- É a mesma coisa.
- Mesma coisa o caralho. Você tá me dizendo que gosta de cheiro de merda.
- Não é merda. É peido. É muito diferente.
- Tá. É merda em estado gasoso. É tão diferente quanto água e gelo.
- Não é não. Eu gosto de ficar pensando nas diferentes texturas. Em quais foram as comidas e os processos químicos que resultaram naquele cheiro específico.
- Cara, cê é maluco.
- Sou não. Sabe o que eu sou, na verdade?
- Fala...
- Gosto de pensar em mim como um enólogo do peido...
- Ah, vá à merda...
- Ah, merda eu não gosto não...

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Drinques

“Eu queria ter ficado lá naquela noite, mais do que qualquer coisa que eu já houvesse desejado. Mas eu sabia que não podia. Eu tinha 15 anos, eu dormia debaixo de um teto que era de meu pai, numa cama que ele havia comprado. Nada era meu, exceto meu coração, meus temores, e minha consciência de que a partir de então, nem todos os caminhos me levariam de volta pra casa”. [Kein Arnold]

Já é tecla batida, não gosto de minha cidade. Muito menos do bairro e do prédio onde eu moro. Ainda menos da porta do meu quarto, que é fina e todos ouvem o que falo e choro, e é toda rabiscada por gente que um dia escreveu pra mim e hoje talvez já não escreveria. Cada dia piora. Absolutamente tudo tem sombras, lembranças, dentro e fora de casa e de mim.

Ainda assim, quando eu fecho a porta, estou pronto pra qualquer coisa que seja só minha, tenho a autonomia, o sono e os sonhos que mereço. Encaro. E caio na real, como também mereço. Não importa o quanto eu me estresse, ao fechar a porta os bons gestos vem à tona. Não importa o quanto eu despiste, quando eu fecho a porta não posso fugir de algumas lembranças.

Meu avô, quando viúvo, quis morar na praia até morrer. Meu pai, quando separado, morou na rua, rodou o país até morrer. Nossa relação com o espaço físico está bastante ligada com o espaço sentimental. Meu tio, quando solteiro, buscou se libertar da saudade, foi parar no Paraná, onde ficou até morrer. Tenho a história de uma paranaense que, sem o namorado, fugiu pra São Paulo, onde tentou se libertar até morrer.

Seria seguro ficar no quarto. Não é mentira dizer que um homem triste leva sua tristeza consigo até pra Lua, se para lá ele for. O homem triste tampouco pensa que achará a felicidade na Lua ou mais perto de casa que isso. Cada homem triste, é triste à sua maneira. Mas provocar alguns desapegos é a maneira que a tristeza tem de tornar-se útil.

Há uma relação nova com a coragem, quando a porrada relativiza o tamanho das coisas, das casas, dos mapas. Nossos medos ganham proporções práticas. Passa a ser importante contemplar o risco, entendê-lo. Rechaçar vontades, coisas seguras. O frio-na-barriga é na pele, é físico. É bonito, é o coração finalmente tratado como o rei. Mas é, muitas vezes, trecho de alguma história de dor.

E a dor é sempre trecho de uma história maior. Que costuma ter desdobramentos inesperados, não-lineares. Assim como nossos passos deixam de seguir, viciados, pra casa, quando, em alguma altura, aprendemos a beber um drinque sozinhos.

domingo, 19 de abril de 2009

O que é e o que deveria ser


O equilíbrio é sempre tênue e frágil
A destemperança é contínua e corriqueira
E cansa como a meia maratona dos casados

Estranho, mas não dura o que é mais certo,
Sendo o certo o que é bonito;

Dura o choro e dura o grito

quarta-feira, 15 de abril de 2009

O Rei

Dizem que sou especial,
um rei, um doce,
etcetera e tal.
Sei...
Imagina se eu não fosse.

domingo, 5 de abril de 2009

Um texto de mentira

Uma alegria de fachada serve. Qualquer coisa que traga um sorriso. Não é de eternidade que preciso. É de leveza e paciência. Leveza pra contrabalancear o inerente peso. Paciência pra quando o peso for mais forte. É de palavras poucas que se faz um bom poema. De bons espaços que se faz uma bela casa. De pouco em pouco que se anda o mundo inteiro. De fingimentos em fingimentos que se faz realidade. Pise no meu pé, e dê uma gargalhada. Fique triste, pra eu fingir que sou feliz, só pra que você não fique triste. Ou fique feliz, pra eu fingir que sou feliz, só pra te acompanhar. Toque uma valsa bonita, que eu vou junto. Nada mal acompanhar o que é belo. E daí se a personalidade for fraca? Se for esse o rótulo, assim seja. O que os outros pensam, se lhe afeta, é pura e simplesmente por ser extensão do que você mesmo pensa. Pensou nisso? Admitindo isso, discorde do que pensam. Discorde de si mesmo. Acredite mais numa idéia de você do que em você mesmo. Sendo essa idéia de você mesmo um objetivo inalcançável, tanto melhor. Sinal de que seu trem jamais vai parar no meio da ferrovia, porque ele ainda não chegou na estação final. E assim, vá acreditando nos sorrisos que encontrar pelo caminho, sejam eles de qualquer cor, mesmo amarelos. Misture nele a cor do seu. Pergunte aos pintores. Ou às crianças, elas sabem. A mistura das cores dá em outras cores. Misture suas cores com as cores do mundo. E que a soma dos sorrisos tristes seja maior do que a soma das tristezas veras. De resto, a esperar só da realidade, perderíamos de lavada. Imaginação, abstração, fantasia e criatividade. E nada de felizes para sempre.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Não houve briga,
tem amor, generoso,
nessa lógica errante.
Eu sei que é horroroso,
mas o fato é que a formiga
bateu no elefante.